Por Érick Delemon
Já aviso que não vim arrotar sobre a crise tanto tempo depois de seu início e tanto tempo antes de se chegar a um consenso de seu fim. Ao contrário, vim mostrar um outro lado. O lado que não é visto na Universidade, e já nem mais na mídia, somente em alguns pontos específicos na Internet, redutos firmes e pontuais em suas críticas, com opiniões e análises muito, mas muito diferente da que tomei contato nas minhas aulas de Sociologia, Filosofia e História no Ensino Médio, e mais ainda dos grupos de estudantes da Universidade. Dentre essas visões que podem parecer incomuns é a de que essa tal crise é culpa justamente do Estado. Esse ente gigantesco que hoje ‘socorre’ empresas acusadas de irresponsabilidade, é colocado sob a luz de culpado pela crise: “criada pela própria interferência do Estado na economia e nas finanças, ao manipular taxas de juros e o mercado de crédito.” 1
De acordo com o prisma liberal a economia é solapada pelo controle estatal há pelo menos um século. Logo, falar em Estado Capitalista como meio para criticá-lo é tolice e no mínimo um artifício de argumentação que não toma base nenhuma na realidade. Por liberal devemos entender que falo da ótica do Liberalismo econômico, e não o liberal que se tem em mente na acepção que foi se consolidando nos EUA como forma justamente de esquerdismo ao se referir a um comportamento mais “flexível” e aberto a mudanças. Assim, essa crise é efeito tardio de uma causa de raizes socialistas – ou pelo menos – esquerdistas.
Uma crítica que a direita faz por exemplo, é o fato de se alardear que a crise não foi tão arrebatadora no Brasil devido à solidez de nossa economia! Eles rebatem dizendo: 2
[…] não há tanta atividade econômica assim, especialmente a de crédito. Mais da metade da economia nacional é informal. O volume de crédito em todo o País, é de cerca de 40% do PIB, já que todo o resto restringe-se aos papéis do governo – títulos de divida pública, que financiam os bancos. As exportações são baseadas em commodities, especialmente no setor agrícola, e, convenhamos, comida continua a ser necessidade do dia a dia.
Mais: na contramão de tudo o que a mídia noticia falam – numa crítica ferrenha ao governo e seu posto maior – sobre a intervenção estatal: 3
[...] a crise não desencadeou a leitura de que o mercado precisa do estado, mas sim justamente o contrário: é o estado quem precisa do mercado, e ainda mais neste momento de crise!
Desde que a marola atingiu o Brasil, a arrecadação tributária vem continuamente caindo. Aí já se comprova liminarmente quem é que precisa de quem. Pois, ao ver o seu cofre minguando a cada mês, o que tem feito o governo para reverter a situação? Ora, ciente de que estrangulava a vaca que lhe fornecia o leite, acena com seqüenciais cortes de impostos sobre a produção, ao mesmo tempo em que camufla suas ações com a cortina de tinta preta (coisa de molusco) bradando fingidamente ajudar àqueles a quem na verdade sugava-lhes as forças. Pois, desde quando desonerar impostos é ajudar ou fazer alguma coisa? Diminuir tributos, é sim, um não-fazer, é deixar de extorquir, é abster-se de expropriar!
Dando o golpe final:
Então, se a solução para a crise é diminuir impostos, porque já não vinha o estado o fazendo antes da crise, como forma de propiciar o crescimento da poupança e o desenvolvimento da nação e gerando com isto mais empregos? Claro, isto significaria uma vez mais admitir que é o mercado que tem prosperidade a oferecer à nação, e não o estado!
Lembro a vocês até que esse autor utiliza Estado com “e” minúsculo pois “O estado não é uma entidade sagrada e nem é nome próprio, logo não merece a inicial maiúscula.” Daí se percebe todo um discurso ausente de qualquer forma midiática.
Por que será? Estranho é pensar que esse é o discurso Liberal, o discurso dos temidos capitalistas que – segundo “aprende-se” à exaustão – são os líderes da globalização, os dominadores do mundo, os 10% que comandam todos os rumos da economia mundial. Será?! Se é esse o discurso hoje da “classe dominante” porque não estão eles no comando dos jornais e meios de comunicação? Não é o que se traduz na realidade.
Não é porque desde que entrei na oitava série não havia sequer um ano em que o tema globalização tivesse uma atenção trimestal das aulas, e sempre nos era apresentado um panorama em que tudo que essa louca globalização fez foi em prol do Capitalismo (enquanto sistema econômico) e (enquanto sua ideologia) o neo-liberalismo. E especialmente porque o neo-liberalismo é tão mais abominado pelos liberais do que pelos próprios esquerdistas, comunistas, sociais-democratas, e afins.
Pois bem que isso é só a ponta do iceberg da argumentação liberal/conservadora contra os abusos do Estado sobre economia. Tentei jogar aqui alguns crivos principais (a meu ver) para a desconstrução do que está posto pela mídia e senso comum. Para mais, peço urgentemente que leiam o artigo do Rodrigo Constantino: A Crise Vista por um prisma liberal, que retrata a visão de quem está de dentro, de quem sabe exatamente o que é Liberalismo, equanto eu somente recentemente tomei contato com essa retórica e lógica, ante anos (ainda correntes) de imáginário estudantil.
Por enquanto, fico por aqui, e perdão pelo post esteticamente longo, mas que no conteúdo é somente um arranhão. Espero em breve poder trabalhar mais o assunto em posts no meu próprio blog, quando puder retomar os posts lá. Até
1 – Instituto Federalista no Mídia sem Máscara: Os Afundamentos Econômicos
2 – idem.
3 – Klauber Cristofen Pires no Mídia sem Máscara: Sobre Bravatas, a Igualdade e a Liberdade
3 Comentários:
O Estado precisa do mercado? Que Estado? E para quem é esse Estado?
Se for o Estado dos banqueiros, dos grandes patrões e dos magnatas do agronegócio pode até ser... Mas e o Estado para o povo que pouco ganha quando essas empresas muito lucram?
O que expressa a riqueza de um país é a capacidade que a iniciativa pública tem de devolver esses recursos em melhoria para a população. Isso disse o professor Hobsbawm num artigo para o The Guardian.
Além do mais dizer que esses medidas para salvar empresas em crise é uma tendência "socialista" também é simplificar e até distorcer as coisas. Afinal de contas, as empresas é que estão sendo salvas. Mesmo quando se diz que empregos é que estão sendo resguardados, quem se beneficia mesmo são seus donos. A situação social dos trabalhadores não muda em muita coisa e eles continuam vulneráveis a uma nova crise.
O que está se revelando de fato é que o modelo econômico e de administração do Estado e das próprias empresas deve ser totalmente repensado. E isso exige pressa, pois os eventos ao redor do mundo revelam um futuro nem um pouco promissor e além disso há uma crise iminente muito mais preocupante que qualquer outra de ordem econômica: a crise do meio ambiente.
Devemos estar preparados...
Não sei se comento primeito o post, ou o comentário do Diego! Os dois estão perfeitos, e se fossem mais longos, me deliciaria ainda mais.
A verdade é que a crise mundial serviu para que novos conceitos fossem revistos, tanto por parte do Estado, como do "Sr. Mercado", provocando discussões sobre o assunto que antes era ignorado, ou visto só por um lado.
Parabéns pelo tema!
Um abração!
Glommer, concordo exatamente com o que você disse, especialmente o que endossa Hobsbawn, e só vem a comprovar que para devolver os recursos para a população ele precisa arrecadar, e ao contrário de cobrar mais impostos, o que os liberais/conservadores querem é justamente a diminuição deles ao mínimo, pra permitir a livre iniciativa e assim naturalmente aumentar a arrecadação em termos absolutos e não em percentagens!
Pro Estado devolver, é preciso ter, e pra isso ele precisa do mercado. Não é questão de Estado do povo ou Estado do banqueiro, afinal ele deveria zelar por todos, e mesmo que prevaleça magnatas do agronegócio, só mostra que a livre iniciativa defendida pelo Liberalismo não é levada em prática, como se vê em PPP's, a porta de entrada para o socialismo.
No início também achava reducionismo chamar tudo que impedisse o livre mercado de socialista. Mas quando se faz uma leitura do socialismo em todos as suas vertentes anteriores, contemporâneas e posteriores a Marx, se tem um quadro meio assim mesmo: qualquer intervenção estatal visa algum objetivo que tem por fim uma limitação de um "poder" do mercado que resulta na transferência de poder para o próprio estado, ou grupo que está nele.
Assim, pra essa ótica, essas medidas são socialistas porque só são uma maquiagem de um problema que o próprio estado criou justamente para receber mais poder depois, que ocorre hoje, ao se ter o estado como o pretenso salvador de empresas que ele mesmo colocou em situação dificultosa!
Ah... e outra: pro pensador conservador/liberal, o ambientalismo é bobagem! Hahaha, essa eu ainda não consegui absorver. Talvez tenha argumentos que também façam sentido, tenho que ler mais sobre. Mas não sei, tá todo mundo na onda verde ecológica....
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